Heranças
Um dia já fui um "desgarrado do pago", já trilhei "mil caminhos" e um desses me levou para longe, por muito tempo, do Rio Grande querido.
Naqueles dias de tardes sombrias e manhãs tristes, uma música me ajudou a manter vivo esse tigre charrua que eu, assim como todo gaúcho, carrega dentro do peito.
Já se passaram 15 anos desde que pela primeira vez soei essa canção no mais distante rincão que um quéra pode chegar, e não me lembro o autor, nem o nome da música, mas a letra trago marcada a ferro no meu coração desde então. Hoje ela ainda me ajuda a lembrar do que é importante, e gostaria de partilhar-lha com vocês.
Meus cabelos têm a cor
dos gelos das madrugadas.
Meus pés que quebraram geadas
mal conseguem me apoiar.
Sei que Deus vai me chamar
em seguida pro seu lado.
Vou feliz por ter deixado
uma herança à partilhar.
Não tenho um palmo de terra
Criação só o cusco amigo
que talvez siga comigo
até a última morada.
O rancho à beira da estrada
não é meu é do patrão
os arreios também são.
Na guaiaca fica nada.
*Quem quiser ser meu herdeiro
que siga a sina de peão
Não vai viver com dinheiro
mas vai morrer com a razão.
Mas deixo a marca das mãos
no couro gasto do laço.
Deixo a força do meu braço
nos arames que estiquei.
Deixo as cordas que trancei
deixo aberto mil caminhos.
Deixo o gosto dos carinhos
nos lábios de quem amei.
Deixo eu sangue no sangue
de algum piazito atrevido.
Deixo meu suor espremido
fertilizando este chão.
Deixo a sombra do galpão
prá algum andejo cansado.
E deixo o açude para o gado
matar sede no verão.
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